Época
Há algumas semanas, uma falha em minha conexão de internet me fez
perceber que havia algo errado comigo. Talvez você tenha o mesmo
problema. Graças a uma dessas panes súbitas que fazem da informática uma
ciência inexata, todos os e-mails que mandei durante um dia inteiro não
conseguiram sair do computador.
Ao final do dia, movido por um tédio que só a desconexão forçada é
capaz de provocar, decidi reler as mensagens presas na minha caixa de
saída. O resultado foi revelador. Por dedicar muito pouco tempo a cada
mensagem, escrevi respostas lacônicas para pessoas que haviam me mandado
sugestões elaboradas. Aceitei um convite para um jantar ao qual não
poderia ir. Enviei a um colega um recado com erros inaceitáveis para
alguém que ganha a vida escrevendo.
A vontade de resolver vários problemas instantaneamente, típica dos
tempos digitais, me tornara afobado, distraído e monossilábico. Não
curti.
Como muitas outras pessoas que passaram a infância no mundo analógico,
mas a adolescência e a vida adulta na era digital, eu desaprendi a
esperar antes de tomar decisões. A chegada dessa geração à vida adulta
marca uma importante mudança cultural.
O americano Frank Partnoy, professor de finanças da Universidade de
San Diego, a descreve como um vício em velocidade. Para ele, os avanços
tecnológicos que fizeram da comunicação instantânea um hábito (e, para
muitos, uma obrigação) intensificaram nosso culto às decisões rápidas e à
intuição.
“No passado, a demora para decidir costumava ser valorizada como um
sinal de sabedoria. Isso desapareceu”, afirma Partnoy. “Poucos líderes
têm a coragem de dizer que não estão prontos para tomar uma decisão e
precisam de mais tempo.”
Nas organizações, essa mudança pode ser percebida em todos os níveis.
Mesmo nos cargos mais altos, em que as decisões teoricamente deveriam
ser mais ponderadas, a pressa virou regra. Pessoas mais bem remuneradas
sabem que seu tempo é mais valioso – e, por isso, tendem a ver a espera
como um desperdício de recursos.
Desde 2005, o culto à velocidade tem uma bíblia: o best-seller Blink,
do jornalista canadense Malcolm Gladwell, que analisa os mecanismos da
intuição. Boa parte do livro é dedicada à “regra dos dois segundos” – o
tempo necessário para que um especialista forme uma opinião (geralmente
correta) sobre um caso, antes mesmo de conseguir elaborar uma explicação
racional.
Blink cita exemplos de psicólogos e críticos de arte cujas
impressões instantâneas se provam tão corretas quanto análises
cuidadosas. Poucos meses depois do lançamento, executivos do banco de
investimentos Lehman Brothers distribuíram cópias do livro a
funcionários e convidaram Gladwell a dar palestras com o mote “siga seus
instintos”. O mercado financeiro comemorava a vitória da intuição sobre
a cautela.
A reação dos defensores da lentidão demorou um pouco. Sete anos
depois, três pesquisadores acabam de lançar livros defendendo uma tese
contrária: para nos tornarmos mais eficientes e tomarmos decisões
melhores, o segredo está na arte de esperar.
O defensor mais aguerrido dessa corrente de pensamento é Partnoy, cujo livro Como fazer a escolha certa
(Campus, 272 páginas, R$ 69,90) chegará ao Brasil em novembro. Nos
Estados Unidos, o livro foi lançado com o título minimalista Wait (Espere). Trata-se de uma improvável ode à espera em tempos de velocidade.
Partnoy afirma que as decisões mais eficientes não são tomadas por
pessoas que seguem sua intuição, mas sim por aquelas que adiam ao máximo
o momento de decidir e usam o tempo extra para amadurecer suas ideias.
O time dos cautelosos é reforçado por Daniel Kahneman, prêmio Nobel de Economia, com o livro Rápido e devagar: duas formas de pensar, que acaba de chegar às livrarias brasileiras. No recém-lançado The art of procrastination (A arte de protelar),
o filósofo John Perry, da Universidade Stanford, também defende (com
humor) as vantagens de quem aprende a esperar. Para esse trio, o canto
de vitória dos apressados pode ter sido prematuro.
2leep.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário